Desenvolvimento do adulto

    Hoje, mais do que nunca, a educação de adultos é premente e necessária. O interesse por esta área de investigação não é recente, seja na Europa, seja nos Estados Unidos. Canário (1999), a partir de uma análise aprofundada sobre este campo, considera que "concebendo a educação como um processo de vida de cada indivíduo, torna-se evidente que sempre existiu educação de adultos." (p. 11).    Em Portugal, o período pós 25 de Abril foi um momento por excelência onde a educação de adultos esteve na ordem do dia. Entre 1974-1976 foram desenvolvidas inúmeras iniciativas com vista a promover e valorizar as manifestações de cultura popular (Melo e Benavente, 1978). Estas actividades baseavam-se nas ideias de educação popular de Paulo Freire (1970, 1996), procurando criar uma "política de articulação entre educação, a construção de uma consciência cívica e os processos de desenvolvimento local." (Canário, 1999, p. 59). Foi o florescer da ligação entre a educação e participação democrática através de associações populares, sindicatos, comissões de moradores, etc. Este facto contribui para que em iniciativas posteriores se procurasse interligar educação de adultos com o desenvolvimento local.

    Contudo, hoje a educação de adultos continua a ser uma realidade marginal, sendo-lhe atribuída muito pouca importância nas políticas educativas que têm sido implementadas ao longo dos anos. Alberto Melo, em entrevista, considera que "a situação portuguesa caracteriza-se, a meu ver, pela falta de uma política coerente, consequentemente, pela ausência de estruturas e processos específicos para a Educação de Adultos." (Abrantes, 1997, p. 50). Para este facto tem contribuído, segundo Lima (1996), uma visão neoliberal da educação, “transformando-a numa agência gerencialista racionalmente orientada para o mercado de trabalho, para a criação de ‘vantagens competitivas das nações’, para a ‘competitividade  económica’ e a ‘aprendizagem individual’, não para o aperfeiçoamento social.” (p. 285). Nesta linha orientativa, a educação de adultos, como espaço de promoção da cidadania, da participação democrática e do desenvolvimento local, é completamente desvalorizada.

    Apesar da situação marginal para que a educação de adultos foi relegada nas diversas políticas educativas, assiste-se hoje em Portugal a um reflorescimento da investigação neste campo (Canário, 1999). Em diversas instituições do Ensino Superior a integração desta área nas Ciências da Educação é uma realidade, a nível do ensino e investigação aos mais diversos níveis: licenciatura, cursos superiores de estudos especializados, mestrados e doutoramentos. Esta situação concorre para uma maior afirmação da educação de adultos no campo do ensino e da investigação, permitindo o florescimento de núcleos e equipas dedicadas à abordagem deste campo. É nesta linha contributiva, de promoção da investigação e conhecimento da área da educação de adultos, que se insere este artigo. Neste sentido, procura-se apresentar alguns dos estudos mais importantes sobre esta etapa, estudos esses que apresentam uma visão dinâmica desta fase da vida: fases do ciclo de vida, perspectivas de desenvolvimento, processo de maturação.

    A primeira percepção que se pode ter acerca da vida adulta é de que ela corresponde a uma época estável, sem grandes mudanças. As transformações físicas mais evidentes efectuaram-se no período da adolescência, tendo também nesse mesmo período, o indivíduo ‘construído’ a sua própria identidade. Assim, nesta perspectiva, a vida adulta é uma etapa de estabilidade, onde a personalidade do indivíduo não sofre alterações. O adulto é concebido como alguém que sente adversidade pela mudança, onde o ditado português ‘burro velho não aprende línguas’ confirma a ideia generalizada de que este não está disposto a efectuar grandes alterações e, em particular, não está inclinado para novas aprendizagens.

    No entanto, a literatura tem desde há bastante tempo acentuado que o facto da idade adulta não ser de forma alguma uma etapa de estabilidade e imutabilidade. A nível cognitivo, diversos autores (Perry, 1970, 1981; Brookfield, 1995, 1998; Mezirow, 1978, 1991; Cavanaugh, 1991) consideram que o pensamento formal não é o último estádio de desenvolvimento cognitivo. Piaget deu bastante ênfase à lógica matemática na resolução de problemas, considerando essa capacidade lógica como necessária e inerente ao pensamento formal. No entanto, verifica-se que a cognição na vida adulta está muito mais ligada a questões pragmáticas da vida real, e que os adultos geralmente procuram aprender de forma a resolver problemas da sua vida quotidiana (Knowles, 1986; Smith, 1988; Knapper e Cropley, 1985). Assim, é necessário considerar que a cognição na vida adulta ‘conhece’ outro tipo de operações para além das operações formais: as operações pós-formais.

    A discussão neste campo consiste na exploração do que constitui ‘as operações pós formais’; isto é, a actividade cognitiva após o estádio de operações formais identificado por Piaget como o fim do desenvolvimento intelectual na infância e adolescência. O pensamento dialéctico é descrito como a forma de pensamento adulto pós-formal no qual os modos de pensamento universal e relativo coexistem. A sua essência é a contínua exploração das inter-relações entre regras gerais e necessidades contextuais. A exploração das contradições e discrepâncias entre o geral e o particular é visto como uma oportunidade para o desenvolvimento pessoal. (Brookfield, 1998, p. 292) 

            Assim, as operações pós-formais na vida adulta acentuam o pragmatismo na resolução de problemas da vida real, a possibilidade de múltiplas soluções, a coexistência entre a relatividade do pensamento (contextualidade) e a universalidade do mesmo (regras gerais). A raciocínio do adulto não segue a lógica formal, sendo, por isso, contextualizado, apresentando, consequentemente, flexibilidade cognitiva. Desta forma, o raciocínio dialéctico (raciocínio que tem em conta a contextualidade e as regras gerais) é fundamental na interpretação nas experiências do indivíduo adulto, dirigindo a sua acção.

    As mudanças ao longo da vida adulta não se limitam apenas ao nível cognitivo, tornando-se necessário conceber esta etapa como um período evolutivo. A vida adulta é percepcionada como a fase onde o indivíduo atinge a maturidade. No entanto, tal não significa que a maturidade seja algo de estático, sendo ‘adquirida’ mal o indivíduo atinja a idade adulta. Diversas correntes epistemológicas (corrente progressista, corrente behavorista, corrente humanista, corrente crítica, corrente construtivista) têm bastante influência na análise desta etapa, significando tal facto que não existe uma visão unívoca e singular deste mesmo período (Caffarella, 1993; Gerstner, 1990; Moura, 1997). Desta forma, procurar-se-à descrever as diversas perspectivas acerca das transformações que acompanham o indivíduo na fase adulta